sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Terra Seca




Eita sol malvado de forte que arrepia os cabelos fazendo brotar água onde nem tem! Sei lá de onde vem tanta quentura, só sei que o pó gruda, e cadê chuva pra limpar? Pé já está grosso de pisar esse chão bom pra fazer santo de barro, mas pó não gruda sem lágrima do céu, nem barro posso fazer! Ô chuva danada que nem lembro direito a cara, só terra e mandacarú, terra e mandacarú, e quando corto um está seco feito farinha! Que foram as duas únicas coisas que sobraram pra gente comer , farinha e miolo de mandacarú! Uma é branca outro é vermelho, e eu cor de terra seca já fazendo parte desse chão igual planta que brota mas nem vinga! Bem que o céu poderia abrir um pouquinho e tornar-se cinza pra molhar tudo por aqui, até eu, que nem sei mais como é que é. Vida dura essa minha sina sem estrada nem ribeirinha, quem dera um grotão que nem sequer é coisa desse chão! Falaram pra mim de uma tal sete quedas, tombo aqui só o meu quando cutuco pedra achando que do chão, é torrão. Testa molhada até que eu tenho, e se bobear, é a coisa mais molhada que eu me lembro, porque o resto é empapado igual meu pensamento! Mas me disseram que tem tanta água nesse chão, que só não sobe porque aqui é alto, e fica tudo lá pra baixo noutras terras. Porque é que eu nasci aqui, é que não sei. Mas cadê força pra andar pra lá, se bem que pra baixo todo santo ajuda, mas se santo ajudasse fazia o céu chorar. Tenho mais fé não. Nem no alto, nem no chão, tenho só ouvido meu coração gritando e se perguntando: canto de cá porque, se o de lá que é bom? Eu já andei tanto nesse chão poeirento, que se fosse em linha reta pra baixo já tinha encontrado quatro das sete quedas pelo menos! Nem precisava, que na primeira eu mergulhava e já tirava essa casca do couro, pra saber de que cor é que eu sou! Eita vida lazarenta, que nem me deu a certeza de um dia melhorar! Sorte quem tem é calango, que qualquer sobra serve de encosto, até dormir o maldito dorme! Eu só descanso quando o escuro vem, e depois de meia hora que os miolos esfriam, de tão cozido que o dia deixa! Eita sorte desgraçada, me deu um chão seco e uma enxada pra plantar, mas diabo, o que? Só se for pra regar com lágrima, mas seco como tô, e acostumado com isso tudo, só me resta é suspirar, e acreditar no dito popular que o sertão vai virar mar! E rezar muito, porque eu nem sei nadar! Eita destino filho de uma égua !

Marrco Blue - Membro da Comunidade Taverna Filosófica.

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